Retratos da Minha Vida


parapua | Estação de trem de Parapuã
 Conto

Retratos da minha vida
 

Malas prontas, no peito um aperto, nos olhos as lágrimas se insinuavam, mas era  preciso jogar um sorriso no rosto pra que minha mãe não notasse o quão apreensivo aquilo me deixava. Chegara o momento, me aproximei da soleira da porta da sala, quando estiquei o pé direito pra fora, senti como se um abismo enorme estivesse por me consumir. Abracei meus pais, minhas irmãs. Olhei pela ultima vez aquela rua quieta, aquela casa vizinha de verdes janelas e pra sempre fotografei em minhas memórias aquela nossa velha casa de futuras tábuas amarelas. Eu estava indo embora. Havia terminado o colegial e o ano mal começara. Era hora de procurar traçar novos rumos. Eu e mais dois amigos estávamos prontos pra encarar a vida na cidade grande, íamos atrás de estudos e principalmente de trabalho. Sorte que os pais dos meus amigos estavam nos acompanhando nesta viagem. Eu pelo menos, nunca havia saído de casa.
Quando o trem na estação deu o seu apito de partida, o coração começou a pulsar mais forte. As primeiras  casas iam ficando pra trás,  a velha estação de repente já ia fazer parte de um passado, meus olhos inda procuraram os braços de minha mãe pra um ultimo aceno, quando o trem terminava de passar o pontilhão que adentrava  a cidade. Era o começo de uma saudade. Minha pequena cidade foi ficando distante. Foram mais de oito horas de viagem noite afora. Era madrugada, quando meus olhos assustados contemplavam as primeiras luzes ainda acesas no momento em que  o trem  começava a adentrar as primeiras casas da periferia de São Paulo. As ruas estavam terrivelmente quietas, assustadoramente desertas.
Assim começava a nossa vida na grande cidade, em verdade fomos morar num bairro vizinho da cidade de Osasco, Vila Yara. Foram difíceis os primeiros meses, as primeiras acomodações, o teste pro  emprego e  por fim o início do trabalho. Os meses foram passando, um dos meus amigos não resistiu  as saudades do lar e em pouco tempo estava de volta. Depois de mais algum tempo a família do meu outro amigo também mudou-se  para Osasco  e eu acabei ficando sozinho. É claro que esta família de amigos também deu-me muito carinho. Recordo-me dos domingos em que passávamos sentados na varanda, ouvindo canções num radio de pilha, enquanto os carros, ônibus e lotações se diversificavam na curva da avenida que passava próximo a casa deles . Os anos começavam a passar, encontrei também novos amigos, uma família que  tornou-se   como se fora minha e que até hoje ainda habita num cantinho do meu coração. Seis anos de saudades dos meus pais e de minha casa foram acumuladas. Voltar de repente era preciso, mesmo com todo o carinho e o apoio dos meus novos amigos, fez-se necessário deixar os sonhos, os planos e voltar. A  minha saúde estava precária. Voltei.
Como foi difícil arrumar a bagagem, novamente a emoção e as lágrimas vieram a tona.Abracei um a um naquele derradeiro momento e enquanto o ônibus fazia o percurso no asfalto de volta para casa, foi doendo, aquela perda que eu novamente estava passando. Eu estava chorando porque deixava para trás a convivência daquela família de amigos que tão importante pra mim se tornara. Eu estava chorando também porque voltava pro aconchego do meu lar, pros  abraços de minha mãe, pros carinhos do meu pai. Era um misto de tristeza e de felicidade.  Eu não voltava de mãos vazias. Havia passado num concurso e providenciara pra que eu pudesse assumir numa cidade perto de casa. Era madrugada, meus passos na rua silenciosa e calma, arfava o peito na ânsia pela chegada,  devagar, abri o velho portão de madeira, adentrei a varanda, ouvi passos lá dentro no correr para abrir a porta, depois choros, sorrisos e abraços, ah! Não importa. Uma aquarela de alegrias  fez-se estampada, a vida naquele dia mais cedo vibrava. Ninguém mais  dormia, ninguém mais queria. As saudades todas foram despejadas, as tristezas todas foram esquecidas. Como eram tão doces aqueles velhos tempos. Velhos tempos quando eu voltei para casa.

 

Autor
Carlos Marcos Faustino
24/04/2013- Quarta Feira- 00h01m

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